O que é inclusão?
É a
nossa capacidade de entender e reconhecer o outro e, assim, ter o privilégio de
conviver e compartilhar com pessoas diferentes de nós. A educação inclusiva
acolhe todas as pessoas, sem exceção. É para o estudante com deficiência
física, para os que têm comprometimento mental, para os superdotados, para
todas as minorias e para a criança que é discriminada por qualquer outro
motivo. Estar junto é se aglomerar no cinema, no ônibus e até na sala de aula
com pessoas que não conhecemos. Já inclusão é estar com, é interagir com o
outro.
O
Papel da Libras na Inclusão do Surdo
A língua de sinais no
âmbito acadêmico é reconhecidamente uma língua de modalidade viso – espacial,
com todas as condições e características de uma língua viva. Como tal é
transparente e icônica, o que significa que mesmo os que não a dominam são
capazes de compreendê-la, ainda que superficialmente.
Além
disso, não há dúvida que a língua de sinais é a língua natural do surdo,
devendo toda a sociedade unir esforços no sentido de oferecer as condições
necessárias para que esta língua seja difundida em todo o país, tanto quanto
ocorre com línguas estrangeiras.
No
caso brasileiro, esta língua é intitulada Libras (Língua Brasileira de Sinais).
A mesma vem sendo difundida desde 1857 e tem sua origem na língua de sinais
francesa, sendo trazida para o Brasil através do Conde francês Ernest Huet que
era surdo. Aqui, o conde adaptou os sinais franceses, dando origem à Libras.
Este sistema foi amplamente difundido e assimilado no Brasil. No entanto, a
oficialização em lei da Libras só ocorreu um século e meio depois, em abril de
2002 - nesse período, o Brasil trocou a monarquia pela república, teve seis
Constituições e viveu a ditadura militar.
O
longo intervalo deve-se a uma decisão tomada no Congresso Mundial de Surdos, na
cidade italiana de Milão, em 1880. No evento, ficou decidido que a língua de
sinais deveria ser abolida, ação que o Brasil implementou em 1881 (BRASIL,
1997).
A
Libras quase mudou de nome e só voltou a vigorar em 1991, no Estado de Minas
Gerais, com uma lei estadual. Só em agosto de 2001, com o Programa Nacional de
Apoio à Educação do Surdo, os primeiros 80 professores foram preparados para
lecionar a língua brasileira de sinais. A regulamentação da Libras em âmbito
federal só se deu em 24 de abril de 2002, com a lei n° 10.436.
Pesquisas
recentes revelam que a Libras, assim como outras línguas de sinais é comparável
em complexidade e expressividade a qualquer língua oral. A Libras é estruturada
a partir de unidades mínimas que formam unidades mais complexas. Possui os
níveis: fonológico, morfológico, sintático e semântico. Como toda e qualquer
língua, aumenta seu vocabulário com novos sinais em resposta às mudanças
sociais, culturais e tecnológicas. E ainda, como as outras línguas variam de
país para país, e sofrem também variações regionais dentro do mesmo território.
A Libras é composta de um alfabeto manual e de expressões faciais e corporais que se combinam formando algo semelhante aos fonemas e morfemas da língua portuguesa. Os elementos que constituem um sinal são chamados parâmetros. Os parâmetros em libras são: configuração das mãos (são formas feitas nas mãos que podem utilizar o alfabeto manual ou não); ponto de articulação (é o lugar onde incide a mão); movimentos (que podem ter ou não); orientação/direcionalidade (é a direção que o movimento assume); e expressão facial e corporal (são utilizados para alguns sinais).
Comportamento
e tecnologia surda
Há comportamentos e tecnologias incorporados na vida diária da Comunidade
Surda, a maioria dos quais objetivam a comunicação, o contato do surdo com o
mundo dos sons, e entre eles mesmos a distância, por meio de uma 'agenda surda'
bem definida, na qual se destacam: os torpedos9, que, apesar de recentes, vêm
se ampliando significativamente; a comunicação por meio de Telefones para
Surdos (TS)10 ,para TS (instalados em residências, entidades privadas ou
associados a telefones públicos), ou ainda, de TS para uma central de
atendimento das empresas de telecomunicações, que se responsabilizam pela
intermediação do contato entre uma pessoa que utiliza o TS e outra que não o
utiliza (o serviço contempla chamadas tanto de TS para o aparelho convencional,
como do aparelho convencional para TS), cujo número, na maioria das capitais
brasileiras, é 1402. Em Porto Alegre, há a diferenciação de uma chamada de TDD
para aparelho convencional, cujo número é 0800-51-7801, para uma chamada de
aparelho convencional para TDD, cujo número é 0800-517802; pagers; bips; fax; a
telemática (comunicação via internet por meio de e-mails, chats, listas de
discussão, icq, etc); sinalização luminosa para campainhas, telefone, alarme de
segurança e detector de choro de bebê; relógios de pulso e despertadores com
alarmes vibratórios; legendas ou tela de intérprete na TV intérpretes in loco
nas igrejas, escolas, repartições públicas, hospitais, delegacias, comércio em
geral etc); adaptação da arbitragem nos esportes, substituindo os apitos por
acenos e lenços; entre outros.
Quanto à
LIBRAS, cabe ressaltar a forma como os indivíduos são nela nomeados,
atribuindo-se aos sujeitos características físicas, psicológicas, associadas ou
não a comportamentos particulares, os mais variados, os quais personificam e,
de certa forma, rotulam os indivíduos. É uma língua, como qualquer outra língua
materna, adquirida efetiva e essencialmente no contato com seus falantes. Esse
contato acontece, normalmente, com a participação nas Comunidades Surdas, aonde
a Cultura Surda vai pouco a pouco florescendo e, ao mesmo tempo, se diversificando
em seus hábitos e costumes, que, pelos contextos distantes e diferenciados,
refletem regionalismos culturais da Comunidade Surda. Nesse sentido, é
fundamental o contato da criança surda com adultos surdos e outras crianças
surdas para que haja um input lingüístico favorável à aquisição da língua,
possibilitado por um ambiente de imersão em língua de sinais.
Você sabia?
NO DIA-A-DIA DA PESSOA SURDA, HÁ JOGOS, TÉCNICAS, BRINCADEIRAS E COMPORTAMENTOS INTERATIVOS, ORA ADAPTADOS DE JOGOS DE OUVINTES, ORA CRIADOS PELA PRÓPRIA COMUNIDADE SURDA.
EX:
v
O jogo “escravos de Jó” foi adaptado por
normalistas Surdos no curso normal do programa Surdo Educador, privilegiando o ritmo com que as “pedrinhas” são passadas de um a outro em detrimento da
melodia;
v
A conhecida técnica do telefone sem fio também
foi adaptada, de forma que os participantes fazem uma fila indiana, e a pessoa que dita a frase ocupa a última posição na fila cutuca o participante à sua
frente, o qual se vira e vê a frase falada em língua de sinais. Em seguida, este cutuca o participante à sua frente, o qual se vira e repete a frase que lhe foi passada.
Assim, sucessivamente, repete-se a frase até o final da fila, quando o último repete a todos a frase que recebeu;
v
A forma como rezam a oração do Pai Nosso também
é interessante: enquanto ouvintes se dão as mãos, os surdos unem os seus pés para poderem partilhar em “voz alta” (com a língua de sinas) da oração universal do cristianismo.
Cultura Surda na educação de surdos
Antes de se tratar das implicações da Cultura Surda na educação e
vice-versa, é relevante ressaltar que a cultura de uma dada sociedade não se
constrói a partir dos processos de escolarização dos conhecimentos, entretanto
tais processos contribuem para a constituição de diferentes significados
culturais. Longe de minimizar o significado da língua de sinais na vida do
surdo, é interessante ressaltar que pesquisas sustentam que 'se uma criança
surda puder aprender a língua de sinais da comunidade surda na qual será
inserida, ela terá mais facilidade em aprender a língua oral-auditiva da
comunidade. A possibilidade de ser plenamente multicultural é ter oportunidades
nos dois mundos, surdo e ouvinte. A língua de sinais, uma vez entendida como a
língua materna do surdo, será, dentro da escola, o meio de instrução por
excelência.
A instrução deve privilegiar a
'visão', por meio do ensino da língua portuguesa escrita, que, por se tratar de
disciplina de segunda língua, deve ser ministrada em turma exclusiva de surdos.
'É preciso que os profissionais envolvidos com o ensino de língua portuguesa
para surdos, conscientes dessa realidade, predisponham-se a discutir
constantemente esse ensino, buscando alternativas que permitam ao surdo
usufruir do seu direito de aprender com igualdade, entendendo-se, no caso do
surdo, que para ser 'igual' é preciso, antes, ser diferente. Recomenda-se que a
educação dos surdos seja efetivada em língua de sinais, independentemente dos
espaços em que o processo se desenvolva. Assim, paralelamente às disciplinas
curriculares, faz-se necessário o ensino de língua portuguesa como segunda
língua, com a utilização de materiais e métodos específicos no atendimento às
necessidades educacionais do surdo. Nesse processo, cabe ainda considerar que os
surdos se inserem na cultura nacional, o que implica que o ensino da língua
portuguesa deve contemplar temas que contribuem para a afirmação e ampliação
das referências culturais que os identificam como cidadãos brasileiros e,
conseqüentemente, com o mundo da lusofonia, exatamente como ocorre na
disciplina língua portuguesa ministrada para ouvintes, que têm a língua
portuguesa como língua nativa.
As crianças surdas desconhecem os processos e os produtos que
determinados grupos de surdos geram em relação ao teatro, ao brinquedo, à
poesia visual e à literatura em língua de sinais em geral, à tecnologia etc.
Dessa forma, deve-se proporcionar às crianças surdas o contato com processos e
produtos elaborados por grupos de surdos, como teatro, brinquedo, poesia visual,
literatura em língua de sinais, tecnologia. Elas têm 'o direito à entrada na
Comunidade Surda e ao acesso a seus processos culturais, sem nenhum
condicionamento. As políticas lingüísticas, do conhecimento, das identidades
são, por sua vez, uma parte indissolúvel dessas potencialidades ou direitos. Cabe
à família e à escola contribuir para que esses direitos sejam respeitados. O processo
de alfabetização de surdos tem duas chaves preciosas: o relato de estórias e a
produção de literatura infantil em sinais (não sistemas de comunicação
artificiais, português sinalizado, ou qualquer outra coisa que não seja a Língua
de Sinais Brasileira (LSB).
Recuperar
a produção literária da comunidade surda é urgente para tornar eficaz o
processo de alfabetização. A produção de contadores de estória, de estórias
espontâneas e de contos que passam de geração em geração são exemplos de
literatura em sinais que precisam fazer parte do processo de alfabetização de
crianças surdas. O papel do surdo adulto na educação se torna fundamental para
o desenvolvimento da pessoa surda. É preciso produzir estórias utilizando-se
configurações de mãos específicas, produzir estórias em primeira pessoa sobre
pessoas surdas, sobre pessoas ouvintes, produzir vídeos de produções literárias
de adultos surdos. Uma outra questão relevante na alfabetização de surdos diz
respeito à sua escrita. Em princípio, vem-se, há anos, no Brasil, alfabetizando
surdos em língua portuguesa e reforçando a Escrita Surda numa interlíngua que
apresenta, geralmente, a estrutura da língua de sinais com vocabulário de
língua portuguesa.
Reflexões sobre a alfabetização de surdos sugerem,
entretanto, que a alfabetização destes deva se realizar, inicialmente, em
língua de sinais. E uma proposta de ensino ainda incipiente no Brasil, mas, sem
dúvida, um caminho que emerge aos poucos e timidamente, por meio da tecnologia
oferecida pelo signwriting™ ou língua escrita de sinais. Acredita-se que o
signwriting é uma forma de agregar as tecnologias educacionais empregadas no ensino
de surdos, além de tornar perenes e sólidas suas idéias, confirmando,
reforçando e ampliando a 'marca surda' de pertinência no mundo e, quem sabe,
por meio dela, a História Surda se construa e se sustente sobre a 'voz' da
maioria surda, definindo-se e estabelecendo, enfim, a Cultura Surda pelo
próprio surdo, por ideal, por opção, por convicção, por SER SURDO.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
— ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA SURDOS, Caminhos
para a Prática Pedagógica, vol1.
—FELIPE,
t. & MONTEIRO, M. LIBRAS EM CONTEXTO. BRASIL: MEC/SEESP, 2006.